Transporte coletivo é diferente de “aglomeração”

Roberto Sganzerla
Especialista em marketing de transportes e mobilidade urbana

Transporte coletivo é diferente de “aglomeração”
16/03/2021 | Opinião

Temos visto nos últimos dias alguns memes e vídeos na internet questionando por que não se pode fazer “aglomeração” em casa, em festas privadas ou clandestinas, e no “transporte coletivo está permitido”.

A resposta é porque não são a mesma coisa, por mais que essa afirmação possa parecer contrária ao senso comum – e fazer afirmações baseadas apenas no senso comum, e não em estudos qualificados, pelos menos referente a essa pandemia, pode ter alta margem de erro.

O problema se agrava quando muitos da imprensa continuam dando voz a tais afirmações em vez de respaldarem seu ponto de vista em estudos científicos e trabalhos confiáveis realizados em diversos lugares do mundo – entre eles no Brasil – que tratam do assunto. Mas emitir opinião pelo senso comum sempre é mais fácil do que pesquisar e estudar.

Vamos inicialmente analisar uma das constatações do inquérito sorológico da capital paulista, realizado pela Prefeitura de São Paulo em parceria com a USP (Universidade de São Paulo) e apresentado em fevereiro deste ano, sobre o risco de pegar a Covid-19 na cidade de São Paulo, conforme noticiado pelo Diário do Transporte:

1 – Entre os que saem para atividades não essenciais, como lazer, bares e restaurantes, a taxa de prevalência é de 19,2% (sem restrição alguma).

2 – Saindo para trabalhar ou para outras atividades essenciais, seja de carro e transporte público (ônibus, trens e metrô), a taxa de prevalência é de 13,6%.

3 – Ficar em casa ainda é mais seguro, mas não muito mais do que em relação a quem trabalha: a prevalência é de 11,4%.

O Professor Jose Medina, médico do Centro de Contingência da Covid-19 em São Paulo, em sua fala na última quinta-feira (11), durante a coletiva do governador João Dória, no Palácio dos Bandeirantes, complementou:

“O risco de contágio é maior em aniversário com aglomerações do que no transporte público. No aniversário, você tem tempo de exposição maior e tem aglomerações de pessoas com faixas etárias diferentes. E com muita informalidade. Todos conhecemos histórias de quem foi em festas e depois apareceram 3 ou 4 pessoas contaminadas. No transporte público, é mais difícil definir isso, mas lá tem protocolo, tem máscara e as pessoas estão pensando no vírus”.

Outro ponto importante a se destacar, que demostra que o transporte coletivo não é um vetor de transmissão como alguns pensam, é o fato de que o índice de contaminados pela Covid- 19 entre os funcionários do sistemas de transportes coletivos, via de regra, tem sido expressivamente menor do que a média da população da cidade, a exemplo de Porto Alegre.

Segundo a estatística realizada em fevereiro, o índice de contaminados pela Covid- 19 entre os funcionários do sistema de Transporte por ônibus em Porto Alegre foi 28% menor que o da população geral da cidade.

Essa não foi apenas uma constatação pontual. Desde agosto, os índices são acompanhados periodicamente em Porto Alegre e, em todos os levantamentos, o percentual de contaminados entre os funcionários do setor de transporte tem sido cerca de 30% menor do que a média da população.

Se o transporte coletivo fosse o grande vetor de transmissão da Covid-19, os colaboradores do transporte público deveriam estar entre os grupos que mais se contaminam com o coronavírus e contraem a Covid-19, abaixo apenas dos profissionais da saúde que trabalham em hospitais, como alguns sugerem.

Isso não ocorre porque a maioria das empresas de transporte coletivo do país e do mundo tem adotado protocolos de segurança, compostos por dezenas de medidas de prevenção à Covid-19. Portanto, o transporte público sendo operado com “protocolos”, e os passageiros fazendo a sua parte na prevenção, pode sim ser um meio seguro para a mobilidade urbana.

Um estudo feito pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) e Universidade de Oxford (Inglaterra) sugere que locais como o transporte coletivo, mesmo com alta ocupação, apresentam baixo risco de contágio, devido às características do serviço:

1 – Período curto de permanência dos passageiros no transporte;

2 – Espaço fechado mas bem ventilado (janelas abertas);

3 – Obrigatoriedade do uso de máscara;

4 – Passageiros não ficam falando, gritando, cantando;

5 – As empresas operadoras seguem protocolos de segurança.

Isso o diferencia significativamente das chamadas “aglomerações”, quer sejam feitas em casa (com pouca ou muita gente) ou em festas clandestinas, que têm como características frequentes:

1 – Períodos longos de permanência das pessoas no local;

2 – Espaços nem sempre bem ventilados;

3 – A maioria das pessoas não usa máscara;

4 – As pessoas conversam, gritam, cantam, comem;

5 – Via de regra, não seguem protocolos de segurança.

A campanha “Protocolo Transporte Seguro”, realizada pela Fetrasul, com apoio da NTU, que foi veiculada em Goiânia e Anápolis, em Goiás, Palmas-TO e Brasília -DF, demonstra de modo didático o estudo realizado pelo MIT/Oxford.

 

Portanto, para os tempos pós-normais, o problema não está no “coletivo”, mas no “coletivo sem protocolos”.

Roberto Sganzerla
Especialista em marketing de transportes e mobilidade urbana

* Artigo publicado no site Diário do Transporte. Link aqui.

Transporte coletivo é diferente de “aglomeração”

Roberto Sganzerla
Especialista em marketing de transportes e mobilidade urbana

+

Benefícios aos passageiros justificam requalificação dos cobradores

por Mauricio Gulin
Presidente do Setransp

+

Quem realmente atende a população?

por Mauricio Gulin
Presidente do Setransp

+
© 2017 EMPRESAS DE ÔNIBUS DE CURITIBA E REGIÃO METROPOLITANA | Feito à mão e em pixel por br + vm