A imagem de um ônibus modelo Caio Gabriela nos anos 1990 enfrentando uma via de terra na cidade de Fazenda Rio Grande, na região Metropolitana de Curitiba reflete bem como o transporte público contribui para uma população vencer os principais desafios em busca do crescimento e de uma vida melhor.
O jovem município que completou 29 anos de emancipação neste sábado, 26 de janeiro de 2019, registra altas taxas de crescimento populacional e de investimentos.
Grandes espaços vazios de terras agora se tornaram loteamentos populosos.
De acordo com estimativa do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 2018 a cidade tinha quase 100 mil habitantes, porém segundo dados da Prefeitura, baseados em levantamentos técnicos, são mais de 140.000 habitantes .
Antes mesmo de se tornar um município independente da cidade de Mandirituba, uma empresa de ônibus já operava na região e, enfrentando ruas de terra, atoleiros e diversas dificuldades, fazia parte da luta da população em prol de uma vida melhor por meio do trabalho e disposição.
Alfredo Willy Isaak, fundador da Leblon, já atuava desde 1951 no setor de transportes, quando começou aos sete anos de idade ajudando o pai a distribuir leite em carroças na região. Em 1965, o jovem se tornou transportador de passageiros ao adquirir seu primeiro ônibus, um Chevrolet 51, na época denominado “lotação”, com o qual realizava o transporte escolar do Colégio Divina Providência, em Curitiba.
O crescimento da família no setor de transportes acompanhava o aumento da necessidade da população de ir e vir, mas os números ainda eram modestos comparados com os de hoje.
Uma mudança no perfil econômico do Paraná foi fundamental para a região correspondente a Fazenda Rio Grande. No ano de 1975, segundo o registro histórico da prefeitura de Fazenda Rio Grande, com a quase erradicação da produção de café na Região Norte do Estado, houve um grande movimento de êxodo rural no Paraná, responsável por atrair muitas pessoas para a Região Metropolitana de Curitiba.
Neste contexto, surgiu a Leblon Transporte de Passageiros que, além de serviços escolares e de fretamento, em 1982 adquiriu a linha Curitiba-Tietê via Fazenda Rio Grande, da empresa Viação Montreal. Na época esta linha transportava aproximadamente mil passageiros por mês em quatro viagens diárias.
O berço de um transporte integrado
O que muitos não sabem é que Fazenda Rio Grande foi um berço dos transportes integrados na região Metropolitana de Curitiba.
A região foi a primeira a oferecer transporte com integração tarifária, servindo de modelo para toda estruturação da RIT – Rede Integrada de Transporte Metropolitano, que por sua vez, inspirou sistemas até mesmo de outros países.
Em 1988, o então prefeito de Mandirituba, Geraldo Cartário, decidiu implantar transporte gratuito entre o distrito de Fazenda Rio Grande e a capital Curitiba.
Na ocasião, duas empresas de ônibus faziam o trajeto. No sentido Sul, ao lado direito da rodovia Régis Bittencourt – BR 116, os serviços eram prestados pela Leblon Transporte de Passageiros. No lado esquerdo, o transporte regular ficava a cargo da empresa Reunidas.
Os ônibus da prefeitura que não cobravam tarifa passaram, no mesmo período, a concorrer com as empresas que já operavam.
A demanda de passageiros começou a crescer expressivamente e os ônibus da gestão pública não davam contam de tanta gente.
O poder público municipal não conseguia arcar com a gratuidade e não tinha condições de ampliar a frota de ônibus da prefeitura.
Após negociações entre o então governador Álvaro Dias, o prefeito de Curitiba, Roberto Requião, e o prefeito Geraldo Cartário, no final de 1988, com o objetivo de beneficiar a população que morava em Fazenda Rio Grande e trabalhava gerando impostos para a Capital, foi elaborado um modelo de integração conectando pela primeira vez uma cidade da região metropolitana à RIT – Rede Integrada de Transporte de Curitiba.
A Reunidas acabou não fazendo parte deste acordo e passaria para a Leblon a incumbência de atender os dois lados da BR 116.
A RIT foi idealizada em 1974, pelo prefeito de Curitiba, Jaime Lerner, arquiteto e urbanista, e representou um avanço significativo nos transportes e na qualidade de vida dos cidadãos. Foi concebido um sistema de corredores de ônibus que priorizava o transporte coletivo no espaço urbano.
Exatamente em 12 de março de 1989, entrava em vigor de fato a integração que deu origem ao sistema M-RIT – Rede Integrada de Transportes Metropolitanos, com um serviço alimentador municipal de Fazenda Rio Grande complementando a linha integrada metropolitana.
Na época, as linhas alimentadoras urbanas de Fazenda Rio Grande eram
– Santa Fé – Atual Iguaçu 1 e 2
– Jardim Dona Rosa – Atual Estados 1 e 2, Santa Terezinha e Ipê
– Juvenal da Cruz – Atual Gralha Azul
– Dona Lia – Atual Nações 1 e 2
– São Francisco – Atual Eucaliptos 1,2,3.
Os serviços se tornaram mais ágeis, além de os passageiros contarem com mais opções de linhas internas na região de Fazenda Rio Grande, favorecendo o crescimento habitacional, como explica o diretor-presidente da Leblon Transporte, Haroldo Isaak
“Entre 1989 e 1992, houve um boom de crescimento em Fazenda Rio Grande. Várias pessoas se viram atraídas a morar na cidade e consequentemente este processo contribuiu para a emancipação do município. Isso ajudou a economia local, mesmo a cidade tendo a característica de dormitório. A arrecadação aumentou e com mais população, aos poucos a infraestrutura da cidade ia se aperfeiçoando”.
Apesar de a experiência ter comprovado que o transporte foi um dos indutores do desenvolvimento da região de Fazenda Rio Grande, somente em 1996 é que foi consolidada a integração da região metropolitana com a entrada de novos municípios.
O sistema de integração se tornou referência nacional em transportes, facilitando o ir e vir das pessoas, teve origem em Curitiba com os serviços urbanos e em Fazenda Rio Grande com os metropolitanos.
A cidade começou a assistir um “boom” de desenvolvimento e eram necessárias ligações internas, dos bairros mais afastados até a região central de Fazenda Rio Grande.
Assim, em 1994, Haroldo Isaak, seguindo os passos seu pai, Alfredo Isaak, passou a gerenciar a Leblon, que operava as linhas metropolitanas e criou a Viação Nobel Ltda. para assumir a operação das linhas alimentadoras dos bairros do município.
A Leblon e a Nobel se tornaram referências de operação e gestão de transportes.
A Leblon Transporte foi a primeira do transporte urbano e metropolitano do Paraná a e a mais antiga da América Latina a conquistar em 1996 a certificação de qualidade ISO 9001, que vem sendo renovado desde então.
Os processos de gestão foram se modernizando e as empresas do Grupo Leblon conquistaram a certificação ambiental ISO 14001 no ano de 2008.
Diversas edições dos prêmios de qualidade da ANTP – Associação Nacional de Transporte Público, um dos mais sérios do setor no País, também foram conquistadas pelas empresas Leblon e Nobel.
Em abril de 2012, a Leblon incorporou uma nova frota de ônibus articulados, com unidades do modelo Neobus BRT, Volvo. Na ocasião, os embarques e desembarques passaram a ser dois dos lados dos ônibus. Antes, entrada e saída de passageiros eram apenas pelo lado esquerdo.
TESTES DE MODELOS DIFERENCIADOS:
A empresa diz que sempre participa de testes de modelos de ônibus diferenciados, seja pelo porte maior, para atender maior demanda, ou com formas de tração menos poluentes.
Em abril de 2016, a companhia circulou com um ônibus de 23 metros, “superarticulado”, da Mercedes-Benz, que tem capacidade de atender um maior número e passageiros que os articulados de 18 metros.
DESAFIOS:
Apesar do desenvolvimento da cidade de Fazenda Rio Grande, ainda há muitos desafios pela frente, em especial na área de mobilidade urbana.
Como ocorre em qualquer outra média e grande cidade brasileira, os congestionamentos estão entre os problemas a serem superados por Fazenda Rio Grande.
E um dos caminhos para que este desafio seja vencido é a melhoria da infraestrutura para o transporte público, com prioridade no espaço urbano para quem se desloca coletivamente.
Faixas e vias exclusivas, além de estruturas e sinalizações adequadas para veículos de grande porte, são ações de fácil implantação, baixo custo e resultados imediatos na melhoria dos deslocamentos.
Muitos dos atrasos e lotação que ocorrem com os ônibus hoje em todo o País é porque os coletivos ficam presos no trânsito como os carros. Isso gera também custos maiores de operação.
Uma realidade, no mínimo, injusta ao se levar em conta que o transporte coletivo ocupa muito mais racionalmente o espaço urbano e polui menos.
Um ônibus básico, de 13 metros de comprimento aproximadamente, transporta 80 pessoas entre em pé e sentadas, mas sem aperto.
Entretanto, como a maioria dos carros não anda com a ocupação máxima, muitas vezes só com o motorista, os automóveis transportam nas cidades brasileiras uma média de 1,3 passageiro.
Usando esta média, um ônibus de 13 metros consegue retirar das ruas de uma só vez 61,5 carros, que ocupariam 258,4 metros.
Isso mesmo que você leu. Em 13 metros os ônibus transportam o mesmo que os carros transportariam, mas tomando quase 260 metros das ruas. Sem contar os ônibus articulados que transportam mais pessoas ainda.
Levando em conta índices de consumo e emissões por quilômetro, a poluição gerada para transportar um passageiro de carros é 17 vezes maior que uma pessoa num ônibus de acordo com estudos do Instituto de Poluição Atmosférica da USP – Universidade de São Paulo, que é tomado como base em grande parte da América Latina.
A melhoria dos transportes e sua infraestrutura dependem não somente da cidade. Os esforços devem ser coordenados entre população, setor privado, municípios e estados, mas realmente é nos bairros e rotas locais que se têm início as mais importantes transformações urbanas que beneficiam a vida em sociedade.
Texto e fotos: Adamo Bazani, especializado em transporte.